2.11.2008

Que futuro para a economia da Região Norte?

Para compreender os principais problemas estruturais com que se defronta a economia da Região Norte, importa definir em primeiro lugar quais as especificidades que apresenta face ao todo nacional para, em seguida, à luz da actual situação da economia nacional, detectar quais as principais consequências para o Norte e procurar vias de resposta face à situação diagnosticada.

O que é que distingue, então, a economia da Região do Norte no contexto nacional?
Em primeiro lugar, a Região Norte é uma região altamente industrializada, tanto pelos padrões nacionais como a nível europeu. Representa cerca de metade do emprego industrial do País e é, na União Europeia, a região com um maior peso do emprego industrial no emprego total. A sua indústria está particularmente concentrada em sectores tradicionais produtores de bens de consumo corrente, com um padrão de especialização muito orientado para a exportação. Quase metade das exportações nacionais de produtos industriais são provenientes da Região Norte. A Região apresenta assim uma particular vulnerabilidade relativamente à conjuntura internacional e às condições de concorrência nos mercados externos.

Em segundo lugar, a Região Norte tem vindo a agravar o atraso relativo que regista, face à média europeia e face à média nacional: segundo o Eurostat, entre 1995 e 2000, a Região Norte viu o seu nível de PIB per capita deteriorar-se de 59% para 56% da média da União Europeia. De acordo com o INE, no período entre 1995 e 1999, o recuo foi de 85% para 81%, relativamente à média nacional.Aprofunda-se assim um quadro global em que a produtividade do trabalho é, em média, mais reduzida do que no País (em cerca de 17 por cento) e, portanto, o rendimento disponível das famílias fica, nesta Região, aquém do rendimento distribuído, em média nacional.

Em terceiro lugar, a Região Norte foi sistematicamente desfavorecida no que diz respeito ao investimento público. O Norte foi, durante largos anos, até 2002, a região NUT II do Continente a que correspondeu uma menor verba do PIDDAC por habitante. Só em 2002 é que a despesa do PIDDAC por habitante da Região Norte ultrapassou a de Lisboa e Vale do Tejo, facto a que não será estranho o facto desta região ter passado a receber uma menor parcela dos fundos comunitários, em virtude do regime de phasing out a que está sujeita. Ainda assim, a capitação da despesa do PIDDAC para a Região Norte não ultrapassou a média nacional.

Também ao nível da distribuição regional dos Quadros Comunitários de Apoio, a Região Norte foi discriminada negativamente. Tanto no primeiro como no segundo QCA, a Região Norte foi a que obteve, relativamente ao seu peso no total nacional, a verba mais reduzida. Já relativamente ao QCA III, a situação é substancialmente diferente, dado o estatuto especial aplicado a Lisboa e Vale do Tejo. A Região Norte passou finalmente a beneficiar de uma dotação per capita superior à média nacional.Finalmente, embora a dinâmica empresarial continue a ser uma potencialidade distintiva da Região e de serem já muitos os casos de empresas e grupos empresariais do Norte que têm demonstrado sucesso nas suas estratégias de internacionalização e na sua adaptação ao novo ambiente de globalização da economia mundial, as estatísticas mais recentes indicam que a Região tem perdido importância na base industrial do País, essencialmente porque ganharam peso alguns grandes projectos de investimento estrangeiro, apoiados contratualmente pelo Estado, situados a Sul e muito orientados para as exportações.

Traçadas as grandes linhas que definem a especificidade do Norte no contexto nacional, de que forma é que as principais tendências de evolução da economia portuguesa condicionam o futuro da economia desta Região?O modelo de crescimento da segunda metade dos anos noventa, impulsionado pela procura interna, favoreceu particularmente o sector dos serviços, nos quais a Região Norte apresenta um significativo défice. Pelo contrário, a indústria transformadora foi relativamente prejudicada.

Neste período, em vez de ser o sector de bens transaccionáveis — condicionado pela exposição à concorrência internacional — a sinalizar a progressão dos salários nominais na economia, constatou-se o inverso. O sector dos bens e serviços protegidos da concorrência internacional (onde se destaca a Administração Pública) assumiu uma excessiva visibilidade nas negociações salariais, a maior parte das vezes com resultados desajustados à realidade concorrencial dos sectores extrovertidos da economia nacional.

Em suma, a competitividade dos sectores abertos à concorrência internacional foi fortemente penalizada. Esta situação prejudicou sensivelmente a Região Norte, dada a forte concentração nos sectores produtores de bens transaccionáveis que apresenta, tanto ao nível da produção como do emprego. Presentemente, a crise por que estamos a passar está a conduzir à perda de empregos nestes sectores, não sendo o sector dos serviços – ainda sub-representado na região Norte e com um dinamismo relativamente fraco – capaz de gerar postos de trabalho em número suficiente para compensar aquela perda.

Que conclusões retirar de tudo isto?
Em primeiro lugar, as consequências do modelo de crescimento económico dos anos noventa aconselham a defender para a Região Norte a manutenção de uma sólida base produtiva radicada na Indústria, sector onde se encontra a nossa vocação, as nossas vantagens competitivas, a nossa tradição e o essencial do nosso know how, para sustentar o desenvolvimento económico regional e nacional e continuar a constituir o principal elo da integração da economia portuguesa na economia europeia e mundial. É da exportação de bens provenientes da indústria transformadora do Norte que obtemos do exterior a maior parte dos recursos indispensáveis à elevação do nível de bem-estar económico de que dispomos, sem incorrer em graves desequilíbrios das contas externas.

O ranking das regiões europeias mais industrializadas mostra que um elevado peso do emprego industrial não significa necessariamente atraso económico, por não se seguir a tendência para uma mais forte terciarização da economia, que verificamos sobretudo em torno das grandes capitais europeias e dos principais centros financeiros: a maior parte das regiões europeias mais industrializadas situam-se entre as que possuem níveis de vida mais elevados e mesmo as que estão abaixo da média comunitária contam-se entre as que registam um crescimento mais rápido.

Em segundo lugar, é hoje reconhecido que a retoma económica em Portugal terá de se basear na sua capacidade exportadora. A competitividade da Indústria deverá estar, assim, no cerne das preocupações dos decisores políticos nacionais.O que sucede é que a Indústria nortenha enferma de baixos níveis de competitividade, não sendo ainda capaz de reter na Região uma grande parte do valor acrescentado potenciado pela sua produção.

Ainda que, mesmo nos sectores ditos tradicionais, a qualidade dos produtos, a capacidade de respeitar prazos de entrega cada vez mais rigorosos, a flexibilidade das linhas de produção, a capacidade para absorver novas tecnologias sejam já (e cada vez mais) os trunfos para captar e fidelizar o cliente estrangeiro, relegando a competitividade-preço para um papel secundário, torna-se necessário adquirir novos factores de competitividade, sobretudo no que respeita ao marketing e a toda a função comercial, mas também ao nível da capacidade de concepção de produtos (aspectos aliás interligados). Só assim será possível controlar toda a cadeia de valor, até ao cliente final, adquirir autonomia face aos grandes sub-contratadores e reter uma parcela mais alargada do valor acrescentado.

É neste sentido que deve actuar a política industrial, contribuindo para o sucesso e fazendo acelerar um processo de mutação da Indústria que, acreditamos, está já em marcha.Em terceiro lugar, é urgente eliminar os bloqueamentos infra-estruturais e relacionados com a qualificação dos recursos humanos que ameaçam condicionar esse mesmo processo, no que respeita concretamente a Região Norte.

Finalmente, importa criar internamente as condições para uma verdadeira internacionalização da Região Norte, não só no sentido de apoiar o reforço da presença das suas empresas nos mercados externos, mas sobretudo com vista a inserir o Norte de Portugal nos grandes circuitos de negócios internacionais, como Região europeia que conta, como Região europeia que interessa visitar e onde interessa estabelecer contactos, como Região europeia onde há oportunidades a explorar.

Para tal, é indispensável que a Região disponha de infra-estruturas – sobretudo portuárias e aeroportuárias – de dimensão e qualidade compatíveis com esta imagem internacional que se pretende transmitir. É também importante valorizar o papel do sector do Turismo no apoio a um novo tipo de posicionamento internacional da Região Norte, desenvolvendo todas as potencialidades que o Turismo de Negócios apresenta e ultrapassando de uma vez por todas a mediocridade da imagem que muitas vezes ainda é transmitida do Norte, unicamente como local remoto e pitoresco para umas férias tranquilas.

Por último, a captação de investimento directo estrangeiro deverá constituir outro objectivo para a estratégia de desenvolvimento da Região Norte. A iniciativa empresarial endógena é dinâmica, mas tende a reproduzir a estrutura sectorial pré-existente. O IDE é assim fundamental para a diversificação da sua base industrial, tornando-a menos vulnerável à concorrência das economias emergentes.

Ludgero Marques,
2003

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